PROPOSTA PARA UM DECÁLOGO DO VEREADOR
Luiz Augusto Geaquinto dos Santos
O que o cidadão espera dos vereadores de sua cidade? Essa é uma pergunta tão difícil de responder quanto diversos são os desafios enfrentados diariamente pelos habitantes dos mais de cinco mil municípios brasileiros. De certo, a sensibilidade para entender as esperanças do eleitor, a ponderação para fazer as opções corretas para a cidade e a capacidade de se conduzir politicamente, da melhor maneira possível, pertencem à personalidade e ao livre-arbítrio de cada vereador. Não obstante, pode-se perguntar, com mais objetividade, o que a Constituição Federal e as leis esperam dos vereadores.
Inicialmente, nota-se que, sob a ótica jurídica, cada vereador representa não somente aqueles cidadãos que lhe confiaram o voto e o apoio eleitoral, mas também, uma vez empossado, toda a população municipal. Consequência lógica disso é que a vereança, sob alguns aspectos, consiste em verdadeira magistratura, na qual o vereador deve abstrair-se dos interesses pessoais e eleitorais mais imediatos, para orientar-se em favor do bem comum, seguindo a reta razão e a corrente ideológico-partidária pela qual se elegeu. Vale ressaltar que a fidelidade partidária tem por parâmetro os estatutos e os fundamentos ideológicos do partido, jamais a mera opinião manifestada eventualmente por outros membros, ainda que dirigentes partidários.
Para assegurar que o vereador possa exercer suas funções com o destemor necessário, a Constituição lhe garante a inviolabilidade por suas opiniões, palavras e votos. Não se trata, porém, de uma inviolabilidade absoluta, mas de uma garantia suficiente para o fim a que se destina e que, por isso, é limitada aos assuntos referentes ao exercício do mandato e à circunscrição do município. Tudo isso demonstra a clara expectativa constitucional de que a vereação seja levada a cabo com independência e sem temor de desagradar a quem quer que seja.
No dia-a-dia político das cidades, a Câmara Municipal é uma caixa de ressonância dos assuntos que estão na pauta da população. Cada vereador é, assim, um vetor para levar as preocupações dos cidadãos à Casa Legislativa. O ordenamento jurídico espera do vereador, nessas circunstâncias, que realize as proposições necessárias, sem jamais se omitir, nem se acanhar na discussão de qualquer questão. Foi alçado à vereança pelo povo justamente para isso: deve confiar na sua sensibilidade política e exercer o mandato em sua plenitude.
O caráter republicano do Estado brasileiro reflete-se também nos municípios. São pequenas repúblicas, visto que todos os assuntos do governo municipal são de interesse não só do prefeito e dos secretários, mas podem e devem ser conhecidos, debatidos e decididos por toda a população. O vereador é, assim, o instrumento democrático e republicano a serviço do cidadão para encaminhar as soluções necessárias.
Qualquer jogador deve conhecer as regras do jogo a fim de que possa jogá-lo. Caso contrário, está fadado à derrota ou à eliminação. Com o vereador não é diferente. Deve conhecer as regras que ordenam o jogo político-representativo do qual participa. Como regras mínimas, o vereador deve conhecer bem a Lei Orgânica e as leis mais relevantes de seu Município, o Regimento Interno da Câmara, assim como as competências municipais previstas na Constituição Federal.
À luz dessas breves considerações, proponho um decálogo do vereador.
DECÁLOGO DO VEREADOR
I.Considere-se e aja efetivamente como legítimo representante de toda a população municipal, almejando o bem comum e não apenas o dos que lhe confiaram o voto ou o apoio eleitoral.
II.Esteja atento às questões do Município, seja acessível aos cidadãos e procure entender as suas expectativas, encaminhando à Câmara as sugestões do povo, de modo a se tornar verdadeiro instrumento democrático-republicano a serviço da cidadania.
III.Esteja consciente de que o mandato lhe confere o ônus de fazer escolhas não para si, mas em nome de outras pessoas e para outras pessoas.
IV.Siga a sua reta consciência e os fundamentos políticos e ideológicos de seu partido político.
V.Exerça as suas funções sem temor de desagradar a quem tenha ideias diferentes das suas.
VI.Manifeste as suas opiniões, proponha as medidas legislativas necessárias e indique ao Poder Executivo as ações que deverem ser realizadas.
VII.Nunca se omita e se sinta alicerçado na certeza inabalável de que a sua interferência em qualquer assunto municipal, nos limites de suas atribuições, é valiosa para a cidade.
VIII.Inteire-se das possibilidades financeiras do Município, das receitas e das despesas e seja vigilante para com as ações do Poder Executivo, especialmente aquelas que importem em gasto de dinheiro público, seja para apoiá-las, seja para censurá-las.
IX.Conheça as regras do jogo, no mínimo, a Lei Orgânica e as leis mais relevantes de seu Município, o Regimento Interno da Câmara e as competências municipais previstas na Constituição Federal.
X.Esteja certo de que a lei criteriosamente elaborada e a observância ao devido processo legislativo são fundamentais para o progresso municipal.
Luiz Augusto Geaquinto dos Santos é Advogado do Senado Federal.